À medida que a indústria de ativos digitais evolui, também evolui a linguagem que usamos para descrevê-la. Um termo promissor —“blockchain madura”— entrou no discurso regulatório por meio da CLARITY Act, uma proposta legislativa bipartidária destinada a fornecer a necessária certeza regulatória em torno de ativos digitais nos EUA. Entre outras coisas, define uma “blockchain madura” como aquela que seja suficientemente descentralizada e não dependa de uma única pessoa ou entidade para operar.
Isso torna a descentralização uma distinção legal crítica e pode também determinar se um ativo em uma determinada rede deve ser tratado como um valor mobiliário.
No entanto, atender à definição de descentralizada não significa que uma blockchain está pronta para escala global ou adoção no mundo real. Para levar a tecnologia blockchain ao uso mainstream, o uso no mundo real, a maturidade deve significar mais do que apenas descentralização: também deve significar prontidão operacional, isto é, a capacidade de uma rede entregar desempenho, confiabilidade e escalabilidade nessas condições. Descentralização é e deve permanecer um pilar fundamental da blockchain. Ela garante resiliência, neutralidade e resistência à censura. Mas descentralização sozinha não é suficiente. Uma blockchain que é altamente descentralizada mas não consegue escalar de forma confiável, ou que sofre downtime com regularidade, ou finaliza transações apenas após minutos de incerteza, terá dificuldade em sustentar os tipos de aplicações (pagamentos, verificação de identidade, ativos tokenizados) com os quais o mundo está pronto para trabalhar.
Algumas blockchains hoje, como Ethereum e Cardano, ainda estão lidando com o que poderia ser chamado de dores de crescimento. Suas equipes de engenharia estão focadas em resolver desafios da camada básica: escalar além de dezenas de transações por segundo, reduzir os tempos de finalização de minutos para segundos, estabilizar mecanismos de consenso ou abordar a confiabilidade de uptime. Esses desafios são reais, e o trabalho é importante. Mas eles também sinalizam que a rede ainda está em fase de desenvolvimento, ainda não pronta para suportar uso de alto risco, de produção.
Em contraste, um punhado de blockchains, como Solana e Algorand, já superaram esses obstáculos fundamentais. Eles demonstraram a capacidade de entregar alta vazão, baixa latência, finalização em menos de três segundos e praticamente zero tempo de inatividade. Essas redes não estão correndo para se estabilizar. Estão focadas em simplificar a experiência do usuário, introduzir desenvolvedores que não são Web3, integrar com estruturas de identidade descentralizada e apoiar casos de uso regulamentados como pagamentos, tokenização e até transações de IA com agentes.
Essa mudança (de sobrevivência para usabilidade) é o verdadeiro marco de uma blockchain madura. É o que sinaliza prontidão não apenas para reguladores, mas para desenvolvedores, empresas e usuários finais.
Então, como reconhecemos a maturidade da blockchain na prática? Uma pista é o roadmap. Se o roadmap de uma blockchain é dominado por upgrades em nível de protocolo, reformulação da infraestrutura central, ou melhorias fundamentais de escalabilidade, frequentemente expressas em anos, é provável que ainda esteja em processo de estabilização. Isso não significa que não irá amadurecer, mas ainda não chegou lá.
Por outro lado, se o roadmap é centrado em novos recursos e na expansão da usabilidade, integrações e novos casos de uso, isso é um forte sinal de que a cadeia está satisfeita com sua base técnica e é capaz de escalar.
A descentralização é importante, e o foco que a CLARITY Act dá a ela é algo positivo. Ao introduzir o conceito de maturidade de blockchain, a legislação proposta nos convida a ir além de pensar com um único tamanho e começar a diferenciar entre redes não apenas pela ideologia, mas pela arquitetura, desempenho e propósito. Ela também estabelece a base para adoção institucional, onde cadeias que atendam a ambos os critérios de descentralização e maturidade operacional podem ser tratadas como infraestrutura pública verdadeiramente.
Num mundo em que blockchains são esperados para liquidar bilhões em valor, hospedar credenciais de identidade críticas e impulsionar pagamentos automáticos entre máquinas, tanto a confiança descentralizada quanto a confiabilidade são essenciais. Devemos manter a descentralização como um princípio inegociável, mas também insistir na confiabilidade no mundo real.
Maturidade, nesse sentido expandido, é sobre equilíbrio. Trata-se de cadeias que preservaram a descentralização enquanto entregam desempenho de nível empresarial. Cadeias que não apenas resistem a capturas, mas resistem a falhas. Cadeias que estão prontas não apenas para experimentação nativa de cripto, mas para uma adoção significativa em indústrias como finanças, energia, mobilidade, e além.
O futuro da blockchain não será moldado apenas pela ideologia. Será moldado por redes que estejam prontas para integrar, para escalar, para liquidar instantaneamente e para desaparecer discretamente na infraestrutura do dia a dia. Esse é o tipo de maturidade que levará a indústria da criptoeconomia da especulação à relevância.
